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Direito à herança: O que fazer quando um pai não reconhecido falece?

Introdução

Recentemente, recebi uma consulta sobre uma pessoa que, sem vínculo prévio com seu suposto pai biológico, foi informada de seu falecimento e contatada por um familiar interessado em confirmar laços de parentesco por meio de um teste de DNA. Casos desse tipo ocorrem com frequência no Brasil e trazem à tona relevantes questões de direito sucessório e reconhecimento de paternidade.
Este artigo tem como objetivo esclarecer os aspectos jurídicos relacionados a essas situações, fundamentado na legislação brasileira vigente.


O reconhecimento de paternidade no direito brasileiro

Fundamentos legais

O reconhecimento de paternidade é um direito personalíssimo, imprescritível e garantido pela Constituição Federal. O artigo 227, §6º, da Constituição assegura que “os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer discriminações relativas à filiação”. Corroborando isso, o artigo 1.596 do Código Civil estabelece que os filhos têm os mesmos direitos, independentemente de sua origem ou do vínculo entre seus pais, sendo proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já consolidou o entendimento de que o direito ao reconhecimento de paternidade é imprescritível, ou seja, pode ser exercido a qualquer tempo, mesmo após o falecimento do suposto pai (ação de investigação de paternidade post mortem).

Reconhecimento via teste de DNA após o falecimento

O exame de DNA é considerado prova conclusiva para o reconhecimento de paternidade e pode ser realizado mesmo após o falecimento do suposto pai. Nestes casos:

  • É necessário coletar material genético do falecido (via exumação, se autorizada judicialmente) ou de familiares próximos, como irmãos ou outros filhos reconhecidos;
  • O procedimento é realizado mediante determinação judicial;
  • A confiabilidade do teste com parentes colaterais pode variar dependendo do grau de parentesco, mas é juridicamente aceita pelos tribunais.

Direitos sucessórios dos filhos não reconhecidos

Base legal

O Código Civil Brasileiro estabelece em seu artigo 1.829 que os descendentes são herdeiros necessários e têm direito à legítima (50% dos bens do falecido). O filho, mesmo que reconhecido após a morte do pai, tem direito à sua parte na herança.

Prazos para reivindicação da herança

É importante destacar alguns prazos legais:

  • Para o reconhecimento de paternidade: não há prazo (imprescritível);
  • Para petição de herança após reconhecimento: 10 anos a contar do falecimento ou da ciência do direito, conforme artigo 205 do Código Civil e interpretação jurisprudencial;
  • Para entrar na partilha já iniciada: deve ocorrer antes da conclusão do inventário e partilha.

Filhos reconhecidos e não reconhecidos têm os mesmos direitos

De acordo com o artigo 227, §6º, da Constituição Federal, e reforçado pelo artigo 1.596 do Código Civil, todos os filhos têm os mesmos direitos sucessórios, independentemente de serem havidos ou não durante o casamento.


O que fazer ao ser abordado por supostos familiares

Aspectos jurídicos a considerar

  • Não ignore a situação: O direito à herança é legítimo, e ignorar pode complicar a situação judicial futuramente;
  • Consulte um advogado especializado: Antes de qualquer decisão, busque orientação jurídica;
  • Documente as interações: Mantenha registro de todas as comunicações com os supostos familiares;
  • Verifique se há inventário em andamento: Caso exista, é importante agir rapidamente.

Possíveis motivações da família em buscar o teste de DNA

Do ponto de vista jurídico, existem várias razões legítimas para os familiares buscarem o reconhecimento:

  • Cumprimento da vontade do falecido (em casos onde ele manifestou o desejo de reconhecimento);
  • Regularização da situação sucessória;
  • Reconhecimento de laços familiares para fins de direito de família;
  • Necessidade de informações genéticas por razões médicas.

Como proceder legalmente

Se você deseja reconhecer a paternidade e seus direitos

  • Contrate um advogado especializado em direito de família e sucessões;
  • Prepare a documentação: certidão de nascimento, documentos pessoais e qualquer prova que indique a paternidade;
  • Ação de investigação de paternidade post mortem: Será necessário ajuizar esta ação, possivelmente cumulada com petição de herança;
  • Consentimento para o teste de DNA: Se concordar com o teste, ele será realizado mediante protocolo judicial.

Se você não tem interesse no reconhecimento

É importante compreender que, juridicamente:

  • Você não pode ser obrigado a realizar o teste de DNA como suposto filho (ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo);
  • Porém, a recusa injustificada pode ser interpretada como indício de paternidade em alguns casos, desde que haja elementos adicionais corroborantes;
  • A recusa não impede que os supostos familiares ingressem com ação judicial.

Possíveis cenários após o reconhecimento de paternidade

  • Inclusão no inventário: Se o processo de inventário ainda estiver em curso;
  • Petição de herança: Se a partilha já tiver sido concluída;
  • Anulação parcial da partilha: Para incluir o herdeiro antes não reconhecido.

Conclusão

Situações envolvendo reconhecimento de paternidade após o falecimento do suposto pai são complexas tanto do ponto de vista jurídico quanto emocional. A legislação brasileira protege o direito dos filhos ao reconhecimento e à herança, independentemente do momento em que isso ocorra.
É fundamental buscar orientação jurídica especializada para entender completamente seus direitos e as possíveis consequências de cada decisão. Um advogado especializado em direito de família e sucessões poderá avaliar as particularidades do seu caso e indicar o melhor caminho a seguir.

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